Enquanto licitação não é concluída,
Guarda Municipal atua até contratação de empresa
RIO - Basta um passeio pelas ruas do
Rio para perceber que flanelinhas continuam intimidando quem procura uma vaga.
Sem falar na dificuldade que motoristas têm para encontrar, com os guardadores
uniformizados, talões para estacionar em áreas do chamado Rio Rotativo. Diante
de tanta irregularidade, mais uma vez a prefeitura promete agir. Até que seja
concluída a licitação para a contratação da empresa que vai operar um novo
sistema — a administração anterior manteve um edital de concorrência na gaveta
desde março do ano passado —, o secretário municipal de Ordem Pública, coronel
Paulo Cesar Amendola, garante que a Guarda Municipal atuará tanto nos locais
onde o estacionamento é permitido quanto naqueles em que é proibido. O plano
começa a ser detalhado hoje, e as ações serão implantadas em dez dias.
— Não tinha solução para o
estacionamento nas ruas da cidade. Agora vai ter — assegura Amendola.— Pela Lei
Orgânica e pela Constituição brasileira, é responsabilidade municipal o
controle do uso do espaço público. Não serão apenas os guardas de trânsito que
reprimirão as irregularidades nos estacionamentos. Os que fazem patrulhamento a
pé e motorizado também vão agir.
AÇÕES EXCEPCIONAIS
De acordo com o secretário, nos locais
onde estacionar é proibido, quem parar será multado. E, se houver flanelinha,
inicialmente ele será advertido. Mas, num segundo momento, ele será detido e
levado para a delegacia mais próxima.
Em áreas permitidas, explica Amendola,
o motorista que não tiver o talão não será multado. Já o guardador que cobrar
pela vaga sem fornecer o tíquete ou exigir um valor superior a R$ 2 pode ser
detido, se não concordar em sair do ponto.
A PM será informada das ações, embora
só vá atuar em conjunto em casos excepcionais, diz o secretário:
— Em logradouros críticos, onde a
milícia atue, por exemplo, as ações terão apoio da PM. Sempre que houver risco
à segurança dos agentes, a PM acompanhará a Guarda.
Por e-mail, o gabinete do prefeito
Marcelo Crivella informou que a Secretaria da Casa Civil “abrirá um processo
licitatório para a escolha e a contratação de uma empresa que fará a gestão das
vagas”. A nota ressalta que a prefeitura está revendo todos os contratos e
licitações da gestão anterior. E que “o prazo para que os processos sejam
retomados ou reestruturados depende do cumprimento dos trâmites legais”.
Atualmente, o sistema está sem comando,
e a prefeitura se limita a vender tíquetes. Pessoas físicas e jurídicas
cadastradas na Secretaria municipal de Transportes podem comprar lotes mínimos
de talões (de oito mil cada). A maioria é adquirida para revenda por sindicatos
que representam os guardadores. Até 6 de setembro do ano passado, a secretaria
havia vendido R$ 3,48 milhões em tíquetes (R$ 0,40, a unidade), um pouco menos
que em igual período de 2015 (R$ 3,58 milhões).
Em março do ano passado, a prefeitura
publicou o edital do Vagas Inteligentes do Rio (VIR), em que seriam utilizados
1.200 parquímetros para controlar com sensores eletrônicos 37 mil vagas na
cidade. As tarifas seriam diferenciadas. O município não informou se adotará
este ou outro modelo.
A falta de um sistema mais
eficiente pôde ser constatada neste fim de semana. Às 14h30m de sábado, na Rua
Barão da Torre, entre as ruas Aníbal de Mendonça e Garcia D’Ávila, em Ipanema,
14 dos 50 carros estacionados estavam sem talão. Situação similar se repetia na
Praça General Osório, em Ipanema, onde dez dos 25 veículos não exibiam boletos.
Ontem às 16h, em Copacabana, na Rua Aires Saldanha, entre as ruas Miguel Lemos
e Almirante Gonçalves, dez de 29 carros não tinham tíquete.
DONOS DAS RUAS
Para a professora Helena Vieira, a
sensação é de que os guardadores são os donos das ruas. Helena e suas duas
filhas vieram de Macaé para passar o réveillon no Rio e ficar mais uns dias.
Pouco antes da virada, sofreram um achaque.
— Estamos hospedadas em Copacabana.
Para guardar o carro no Ano Novo, tivemos que pagar por fora, três dias antes,
ao flanelinha que fica numa rua interna do bairro — conta Helena. — Isso é uma
máfia. Sabemos muito bem que se não pagássemos, ele teria arranhado nosso carro
ou furado os pneus.
A ausência de fiscalização leva ainda a
situações desagradáveis, como a vivida anteontem pela técnica em radiologia
Amanda Mello. O guardador que a abordou na Praça General Osório tinha talões e
estava uniformizado. Porém, no momento em que ela foi dar os R$ 2, acabou sendo
alvo de um pedido:
— Ele perguntou se eu podia pagar uma
água para ele guardar o meu carro, porque estava muito calor. Disse que não
tinha como, porque só possuía notas grandes. Ele então pediu meu boleto de
volta e anotou o horário, o que não havia feito antes. Saiu resmungando, como
se fosse minha obrigação dar um dinheiro a mais.
Para quem é turista, os abusos podem
ser novidade, mas para moradores da cidade é rotina. Tarcísio Lima e a mulher
Sueli afirmam que nunca estacionam em vias internas de Copacabana, para não ter
que lidar com flanelinhas. Para eles, o sistema de tíquetes é eficiente, mas
tem alcance limitado.
— Mais para dentro do bairro, a gente
não estaciona, porque geralmente eles querem forçar um preço acima da tabela —
afirma Sueli.
Ontem, nas ruas Leopoldo Miguez e Aires
Saldanha, vias internas de Copacabana, a proporção era quase de um flanelinha
para cada quarteirão. Em um dos casos, um deles conseguiu estacionar um veículo
em frente à entrada da garagem de um prédio, após conversar com o porteiro. Já
em Ipanema, a atuação dos flanelinhas parecia liberada nas ruas Nascimento
Silva e Vinícius de Moraes.
CONTRATO COM EMPRESA
Na última tentativa efetiva de melhorar
o sistema de estacionamento nas ruas, a prefeitura escolheu a Embrapark, por
licitação, para operar 9.094 vagas do Rio Rotativo em oito bairros da Zona Sul
(do Leme a São Conrado). A empresa assumiu o serviço em 2009, mas nunca
conseguiu vencer a guerra contra os flanelinhas. Em 2014, o contrato com o
município foi encerrado, sem ser renovado.
Em junho de 2014, a prefeitura lançou
edital a fim de contratar outra empresa para administrar um novo modelo de Rio
Rotativo, que acabou suspenso pelo Tribunal de Contas do Município (TCM).
Feitos os ajustes determinados, as cláusulas da licitação foram aprovadas pelo
tribunal em junho de 2015. A prefeitura, no entanto, levou nove meses para
colocar a concorrência na rua, e, ainda assim, voltou atrás, revogou o edital e
transferiu o assunto da Secretaria Especial de Concessões e Parcerias
Público-Privadas para a Casa Civil, onde ficou parado.
Fonte: O Globo